A revista V E R B O 21 (http://www.verbo21.com.br ) acaba de publicar o conto meu A OMOPLATA, ganhador do Prêmio Newton Sampaio 2009, promovido pela Secretaria de Cultura do Paraná. Abaixo o início do conto, seguido do link. Leiam lá, comentem e recomendem:
A omoplata
Por Marcus Vinícius Rodrigues
— E essa cicatriz?
Ele passou a mão pela omoplata esquerda do outro. Era um risco
— Parece que lhe arrancaram uma asa.
— Como é?
— É! A marca é certinha como se você tivesse uma asa aqui e alguém tivesse arrancado.
O outro riu.
— Asa?
Agora ele vai dizer que eu sou um anjo caído do céu, pensou o menino.
— Como um anjo. Alguém lhe arrancou essa asa e você caiu do céu, coitado.
O outro se virou e olhou para ele. Um olhar doce atrás dos cachos dos cabelos. Passou para debaixo de uma das pernas dele, como um gato dengoso, se enroscando mais ainda.
— Você me acha um anjo?
— Acho. Um anjo que caiu do céu.
— É?
O menino ficou esperando que ele falasse dos cachos.
— Um anjinho.
— Eu já fiz papel de anjo, na escola. O anjo da anunciação. Todo ano eu tinha de fazer. Eu nunca queria, mas as freiras me adulavam até eu aceitar. Eu ia lá e dizia que ela ia ter um filho de Deus.
— Aí ela dizia: mas eu não conheço o homem.
— Eu era pequeno, não sabia o que queria dizer isso. Ficava perguntando às freiras, mas elas não respondiam. Eu não entendia como Maria não sabia o que era um homem.
— Mas você ia lá e dizia tudo direitinho.
— Como um anjo.
— Também, com esses cachos.
O outro abriu um sorriso satisfeito. E riu mais ainda quando ele começou a morder levemente a sola de seu pé. Tentava escapar e não conseguia. Ele abriu suas pernas e começou a lambê-las, foi subindo pelas coxas até a bunda.
— Vem cá, Miguel Arcanjo!
O menino riu ainda mais.
— Olha, você escolheu o anjo errado.
— Por quê?
— Miguel não foi aquele anjo que expulsou Adão e Eva do Paraíso? Acho até que foi ele que pôs fogo em Sodoma, a espada flamejante. É melhor não chamar ele aqui não, viu?
— E se eu lhe chamar de anjinho safado, pode?
— Ou Gabriel.
— Gabriel?
—O anjo da anunciação, bobo. O inseminador.
— Inseminador? Você pensa umas coisas, cara.
— Mas não foi isso que aconteceu? A primeira inseminação artificial da história. Ou celestial, se você quiser.
— Não dá pra acreditar que você tá falando essas coisas.
O menino ficou sério, olhou para ele com gravidade.
— E se não foi nada disso. Já pensou? O anjo foi lá e resolveu tudo do jeito antigo. Afinal, eram os tempos antigos, não era?
— Como você é safado!
— Aprendi com as freiras.
— Então vem cá, safadinho. Eu quero mais do meu anjinho agora.
— Mais?
— É.
— Agora?
Ele balançou a cabeça num sim. O outro respondeu divertido.
— Eis aqui a serva do senhor. Fazei em mim segundo a sua vontade.
***
4 comentários:
Prêmio com mérito indiscutível e orgulho para nós, seus admiradores.
Grande conto!
Olá, Marcus;
Recebi seu conto por email. Amei. Admiro quem sabe escrever tão bem. Vou "seguir" seu blog a partir de hoje. Gostei muito.
Abraços
Obrigado, Marco Antonyo,
Seja bem vindo!!!
Bom demais, como disse no e-mail. Coisa para poucos, escrever assim. E tô te anexando lá no Blag!
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