NENHUMA DOR
FRASES, FRAGMENTOS, IMAGENS, PEQUENAS COISAS
Toda via
tem seu andarilho incansável.
Todo andarilho tem um dia
de pousar à margem de um regato.
Todo regato é via
de não se andar.
Todo andarilho deveria
tentar o nado.
Todavia...
As reticências do poema VIAS atraíram minha atenção. Reticências sugerem caminhada, extensão... A própria poesia é andarilha, trilheira, percorre todas as vias, as viáveis e as nem tanto, a mão e a contra-mão. O poeta é um caminhador das palavras, o flâneur baudellairiano, caminha andando e sem andar também, com o pensamento condoreiro, anda por cima, por baixo e por dentro das coisas. Vias, de Marcus Vinícius Rodrigues, fala do entrave da poesia, da não-via, e , diante dele, escapa com uma palavra transbordante de movimento e fuga: todavia, ainda mais quando acompanhada de reticências. Aí, o poeta é a própria palavra, e esse é um momento de grande intensidade lírica no poema. E, então, o poema se abre para a dubiedade que todavia também traz, e não se fecha nunca, não acaba. Fecha-se os olhos e viaja-se com Vias ( e vê-se, também), tudo na imaginação.
No texto: UMA MIRADA SOBRE OS NOVOS POETAS DA BAHIA: RETRATO POÉTICO DE UMA ERA DE INCERTEZAS, de LUCIANO
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... em vosso claro olhar, e leve,
navegam coloridas geografias,
azul de litoral, paredes frias,
vontade de fazer o que não deve...
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Então, pintei de azul os meus sapatos
por não poder de azul pintar as ruas,
depois, vesti meus gesto insensatos
e colori as minhas mão e as tuas.
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Mais que o claro domingo e o claro cântico
que o litoral deixou em meio às blusas,
retém seu corpo as tardes inconclusas
sepultadas no azulescido atlântico.
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Tive a sorte de ganhar um prêmio (Prêmio Copene, hoje Brasken, da Fundação Casa de Jorge Amado) e assim fazer minha estreia na literatura. Alguém dirá, um bom amigo talvez, que tive a sorte e o talento. Talento? Acho que sim, mas não se trata de uma crença absoluta em mim, trata-se de uma crença construída de pequenos sucessos, com muita desconfiança e um suspiro esperançoso no final: É! Talvez eu seja bom! Dito isso, para não acharem que sou modesto, vamos tratar da sorte de ganhar e da sorte de perder.
Sim! Ganhar um prêmio também é sorte, independente do talento. Afinal, não se pode esquecer que naquele júri existem pessoas com suas idiossincrasias, suas crenças particulares sobre o que é bom e belo. É uma sorte encontrar uma banca que esteja em sintonia com sua forma de escrever. Lembrar disso ajuda a ganhar com serenidade. Afinal, pode ter acontecido apenas isso, sintonia, e não o reconhecimento de um talento absoluto acima dos gostos pessoais. E ajuda a perder com serenidade também, pelos mesmos motivos vistos de maneira invertida.
Às vezes, a gente ganha por azar, por que o livro não era bom e a gente acaba publicando algo que precisava de mais maturidade. É a partir desse raciocínio que penso na sorte de perder. Pode-se ganhar muito com isso. Vejam 3 VESTIDOS E MEU CORPO NU. Trata-se de um livro de contos pequeno. Esses contos já compuseram um livro maior. Este livro participou de concursos e não ganhou. Que sorte! Ficou tão melhor o livro assim, tão uno, tão forte! E o próximo, com outros contos do mesmo livro, será também forte. O livro grande se diluía, ficava sem uma identidade marcante. Esses pequenos são muito melhores. E olhe que são os mesmos contos.
Foi sorte!
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